sexta-feira, 20 de agosto de 2010

USO DE IMAGEM SEM CONSENTIMENTO SÓ DÁ DIREITO A INDENIZAÇÃO SE PROVOCAR DANO





O uso publicitário de fotografia que mostrava família em visita à feira Expointer não configurou dano aos retratados. Com esse entendimento, a 10ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Reio Grande do Sul (TJRS) acolheu recurso do Estado do Rio Grande do Sul. A ação indenizatória por danos morais, que tramitou na 4ª Vara da Fazenda Pública de Porto Alegre, teve sentença favorável aos visitantes da feira.

O casal autor teve a foto de sua família utilizada em peça publicitária que divulgou a feira no ano de 2002. Em recurso, o Estado apontou a finalidade institucional, e não-lucrativa, da publicidade da foto, que, inclusive, enfatizava aspectos positivos da cultura gaúcha. Ponderou estar evidente não se tratar de uma situação que provocou dano moral, o que sequer foi implicado em momento algum da ação. O juiz-convocado José Conrado de Souza Júnior observou não haver controvérsias quanto à publicação da foto dos autores, bem como quanto à falta de um pedido de autorização. Entretanto, disse ser necessária a verificação da ocorrência ou não dos requisitos à indenização.

Asseverou ser inegável "a proteção constitucional à imagem ou intimidade", ainda que pertinente a fixação do alcance da garantia. Através da referência a doutrina e jurisprudência, moldou a noção de que a divulgação de informações de cunho privado de caráter apelativo, sem que haja interesse público no acesso a tais dados, constitui "clara e ostensiva contradição com o fundamento constitucional da dignidade da pessoa humana". No caso que foi julgado, ressaltou que a família se encontrava em local púbico quando da fotografia, não se relacionando com qualquer fato íntimo.

O juiz destacou o argumento do Estado, segundo o qual os autores, em momento algum, demonstram a forma como teriam sido atingidos em sua honra. Para o magistreado, é motivo de orgulho figurar em publicidade com o intuito da que foi produzida. Assegurou que, a não ser que houvesse motivo "justo e jurídico", para que desejassem o anonimato, "o que, no caso, não restou demonstrado". O magistrado avaliou que, se fosse julgado procedente o pleito dos autores, "fotografar eventos públicos passaria a ser considerado atividade ilícita, ou, no mínimo, de grande risco, pois sempre haveria a possibilidade (concreta) de alguém mais aparecer na foto e requerer danos morais por isso". Ainda, seria "o que de algum tempo se vem delineando: a consagração de uma sociedade litigiosa e tarifada pela intolerância da convivência".

Acompanharam este voto os desembargadores Luiz Lúcio Merg, que presidiu a sessão, e Paulo Antônio Kretzmann.

O acórdão data de 15/4/2004, e foi publicado na Revista da Jurisprudência nº 240, de março de 2005. Proc. 70008025348

Leia a íntegra do acórdão:

DANO MORAL. DIREITO À INTIMIDADE. VEICULAÇÃO PUBLICITÁRIA DE FOTO DA FAMÍLIA OBTIDA EM EVENTO PÚBLICO. INOCORRÊNCIA DE FATO NEGATIVO A ENSEJAR INDENIZAÇÃO.

A veiculação de imagem deve ser sempre autorizada. Porém, dano algum há para indenizar se dessa exposição não resulta fato negativo ou depreciativo aos autores, que, na ocasião, participavam de evento de largo acesso ao público.

PROVERAM O RECURSO DO DEMANDADO, JULGANDO IMPROCEDENTE A AÇÃO. APELAÇÃO CÍVEL DÉCIMA CÂMARA CÍVEL Nº 70008025348 COMARCA DE PORTO ALEGRE ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL APELANTE RENATO TRINDADE BENITES APELADO PATRICIA PROENCA BENITES APELADA ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos. Acordam os Magistrados em Décima Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, dar provimento ao recurso do demandado, julgando improcedente a ação. Custas na forma da lei.

Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores Desembargadores Luiz Lúcio Merg, Presidente e Revisor, e Paulo Antônio Kretzmann. Porto Alegre, 15 de abril de 2004.

DR. JOSÉ CONRADO DE SOUZA JÚNIOR, Relator. RELATÓRIO DR. JOSÉ CONRADO DE SOUZA JÚNIOR (RELATOR) O ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL apela tempestivamente objetivando a modificação de sentença que, nos autos da ação indenizatória movida por RENATO TRINDADE BENITES e PATRÍCIA PROENÇA BENITES, julgou procedente o pedido.

Nas razões ressalta a incontrovérsia a respeito dos fatos, ou seja, a publicação da foto da família na divulgação da Expointer/02. Refere o caráter publicitário-institucional da fotografia, ausente finalidade lucrativa.

Ressalta evidente a ausência de qualquer caráter ou circunstância a implicar dano moral.

Ao contrário, a fotografia enfatiza aspectos positivos da cultura rio-grandense. Não houve alegação de sofrimento pela publicação da fotografia. Acaso mantida a condenação pede a redução do valor para o máximo de 10 salários mínimos.

Dispensado o preparo, os autores contra-arrazoaram pedindo a manutenção da sentença. Neste Grau o Dr. FRANCISCO WERNER BERGMANN, ilustre Procurador de Justiça, lançou parecer opinando pelo improvimento do apelo. Vieram os autos para julgamento. É o relatório. VOTOS DR. JOSÉ CONRADO DE SOUZA JÚNIOR (RELATOR) Primeiramente, cumpre consignar a ausência de controvérsia acerca da publicação da foto dos autores no folheto promocional da Expointer, edição 2002, acostado à fl. 12.

Não houve, de fato, autorização para a veiculação da imagem. Disso decorre, entretanto, analisar-se se presentes os requisitos para a indenização de eventual prejuízo, sob qualquer de suas espécies, material ou moral. Não há negar a proteção constitucional à imagem ou intimidade.

Porém, é necessário fixar-se o alcance dessa garantia. O caminho é encontrado na lição de Alexandre de Moraes (in Direito Constitucional. 12 ed. São Paulo: Atlas, 2002. p. 79): Os direitos à intimidade e a própria imagem formam a proteção constitucional à vida privada, salvaguardando um espaço íntimo intransponível por intromissões ilícitas externas. A proteção constitucional consagrada no inciso X do art. 5º refere-se tanto a pessoas físicas quanto a pessoas jurídicas, abrangendo, inclusive, à necessária proteção à própria imagem frente aos meios de comunicação em massa (televisão, rádio, jornais, revistas, etc.).

Os conceitos constitucionais de intimidade e vida privada apresentam grande interligação, podendo, porém, ser diferenciados por meio da menor amplitude do primeiro, que encontra-se no âmbito de incidência do segundo. Assim, intimidade relaciona-se às relações subjetivas e de trato íntimo da pessoa, suas relações familiares e de amizade, enquanto vida privada envolve todos os demais relacionamentos humanos, inclusive os objetivos, tais como relações comerciais, de trabalho, de estudo, etc. Encontra-se em clara e ostensiva contradição com o fundamento constitucional da dignidade da pessoa humana ( CF , art. 1º , III ), com o direito à honra, à intimidade e à vida privada ( CF , art. 5º , X) converter em instrumento de diversão ou entretenimento assuntos de natureza tão íntima quanto falecimentos, padecimentos ou quaisquer desgraças alheias, que não demonstrem nenhuma finalidade pública e caráter jornalístico em sua divulgação. Assim, não existe qualquer dúvida que a divulgação de fotos, imagens ou notícias apelativas, injuriosas, desnecessárias para a informação objetiva e de interesse público ( CF , art. 5º , XIV ), que acarretem injustificado dano à dignidade humana autoriza a ocorrência de indenização por danos materiais e morais, além do respectivo direito à resposta."

Os autores foram fotografados, segundo afirmam na inicial, em edição anterior da Expointer. Estavam em ambiente aberto ao público, embora com cobrança de ingresso, não se relacionando a fotografia com qualquer fato íntimo da família. De outro lado, não há uma linha sequer na inicial a respeito da forma pela qual teriam sido os apelados atingidos em sua moral ou honra. E assim não poderia ser. Ao contrário do alegado, tenho convicção que o cidadão comum estaria honrado em ilustrar promoção da maior feira agropecuária da América Latina, especialmente quando ressalta as tradições gaúchas, exceto, é claro, se tivesse algum motivo justo e jurídico para não querer aparecer em público, o que, no caso, não restou demonstrado e sequer foi aventado.

A entender-se de outra forma, fotografar eventos públicos passaria a ser considerada atividade ilícita, ou, no mínimo, de grande risco, seja com intuito publicitário, jornalístico ou mesmo privado, pois sempre haveria a possibilidade (concreta) de alguém mais aparecer na foto e requerer danos morais por isso. Seria, a meu sentir, o que de algum tempo se vem delineando -a consagração de uma sociedade litigiosa e tarifada pela intolerância da convivência. O outro passaria sempre a ser fonte imediata de lucro. Dito isso, é bem de enfatizar não haver caráter depreciativo da imagem dos autores na publicação.

De sua vez, a jurisprudência desta Câmara é comunga do entendimento ora sustentado: INDENIZAÇÃO. PROPAGANDA. USO INDEVIDO DE IMAGEM. FOTOGRAFIA. AUSÊNCIA DE CONSENTIMENTO. NEXO CAUSAL. DANO PATRIMONIAL. AUSÊNCIA DE DANO MORAL.

1 - Ação que a parte visa a reparação de danos pelo uso indevido de imagem. Publicidade de fotografia de segurança que serviu como modelo junto à empresa, sem a devida autorização. Presente o nexo causal a ensejar a obrigação do proprietário da empresa em ressarcir o dano material.

2 -O dano moral não restou provado nos autos, já que inexistentes elementos a demonstrar o prejuízo do autor na esfera psíquica e no seu cotidiano, eis que a fotografia não traduz fato negativo.

3 -Verba honorária bem fixada em sentença.

Apelo improvido. (6 FLS D.) (APELAÇÃO CÍVEL Nº 70004115820, DÉCIMA CÂMARA CÍVEL, TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RS, RELATOR: PAULO ANTÔNIO KRETZMANN, JULGADO EM 22/05/2003) Diante disso, não ocorrendo qualquer dano pela veiculação de fotografia da família dos autores, nada há para indenizar. Voto, por isso, pelo provimento do recurso do réu, julgando improcedente a demanda.

Inverto a sucumbência, fixando honorários em R$ 500,00. DES. LUIZ LÚCIO MERG (PRESIDENTE E REVISOR) -

De acordo. DES. PAULO ANTÔNIO KRETZMANN - De acordo. Julgadora de 1º Grau: MARILEI LACERDA MENNA

FONTE: http://www.jusbrasil.com.br/banners/Noticias_Juridicas_View_SuperBanner.html?v=0.5735425276597569

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